A Trindade vê-se diante de um impasse. Deus Pai está sério, preocupado. Seu Filho está decidido a visitar a Criação, assumindo a natureza humana e fazendo-se um de nós.
O Pai resmunga contrafeito que isto é coisa de menino criado sem mãe. O Filho rebate que não foi criado, que é Unigênito, e a discussão parece não ter solução. O pior é que nem se pode falar em conflito de gerações, pois o Filho repete que não foi gerado, que é “consubstancial ao Pai”. Não adiantam nem os conselhos sábios do Espírito Santo. A eles o Filho responde com outro argumento; Se Deus é o Artista e a Criação é sua Obra Prima, “todo Artista tem que ir aonde o povo está...”
Por fim, prevalece o entendimento e a Trindade está em consenso. É preciso revelar ao Homem o verdadeiro caráter de Deus, resgatando-o e comunicando a ele o sonho que esteve presente desde o início dos tempos: Deus, que É amor, criou o homem POR amor e PARA o amor.
Isto posto, a Trindade vê-se diante de um mistério: a Encarnação supõe ensinar Deus a ser Homem. Que desafio!
O Espírito, em sua sabedoria, sugere um método bem natural: Como os homens aprendem a ser homens? Com uma mãe, claro!
Aqui cabe um parêntesis: para mim, que sou professor, é interessante pensar que um dos primeiros desafios que Deus enfrentou já tinha a ver com educação...
Mas continuando minha meditação, há então que se escolher uma mãe. Uma mulher que aceite o desafio de ser a mãe de Deus. Já pensaram? Aqui, vamos dar mais asas à imaginação.
Deus, sem limites de Tempo e Espaço, de passado, presente, futuro ou lugar tem diante de si toda a História. Seu olhar percorre épocas, civilizações, culturas, países, cidades, pessoas... A tarefa é original: escolher a própria mãe (Freud iria adorar!).
Quanta dúvida! Em que lugar, em que momento da História, em que povo, país ou cidade estará escondida mulher tão especial?
Quem sabe, na Grécia Antiga, berço extraordinário de cultura, da filosofia? Ou na Roma dos Césares, com seu poder e influência? Talvez no Império Britânico, com toda a sua pompa e circunstância?
E se Deus fosse escolher em nossa época; nos Estados Unidos, por exemplo, a superpotência hegemônica, símbolo de poder diante de todas as nações? O Brasil teria chance de esconder esta mulher?
Mas não... Deus abandona os países e civilizações e começa a procurar por pessoas...
Quem sabe, buscando entre as figuras femininas que se destacaram ao longo dos séculos?
E o olhar de Deus contempla (e nós vamos junto...) o desfile de mulheres notáveis ao longo da História: Teresa D’Avila, Joana D’Arc, Madre Teresa, Irmã Dulce e tantas outras. Algumas fortes, poderosas e influentes, como Golda Meir, Indira Gandhi... Outras, heróicas, sofridas e anônimas, Marias e Clarices admiráveis de todos os tempos.
Não, nenhuma delas...
E é, mais uma vez, o Espírito Santo que chama a atenção para uma época “desimportante” da História. Num canto obscuro do Império Romano, num pequeno país, invadido e subjugado pelo poder estrangeiro, numa aldeia perdida entre as montanhas da Galiléia, Nazaré, brilha a luz de uma camponesa simples, uma mulher CHEIA DE GRAÇA!
O Filho, emocionado, contempla sua Mãe... e sorri.
O Pai enche-se de orgulho pela sua Criação, e sorri.
O Espírito, transbordante de Amor, prepara o momento que será chamado de Plenitude dos Tempos e sorri.
A Trindade constata, mais uma vez, que tudo o que foi criado é bom. E toda a bondade do mundo cabe no coração daquela mulher que é filha de Deus Pai, será mãe de Deus Filho e esposa de Deus Espírito Santo.
E assim, um dia... alguém segurou Deus em seu colo e o chamou de “meu filho” Ensinou-o a andar e falar. Riu de suas travessuras, soletrou com Ele as primeiras letras.
Mais tarde, preocupou-se com suas viagens, acolheu os amigos que trazia nas raras visitas à casa. Ouviu, com o coração aos saltos, seus discursos. Acompanhou seus passos e gestos, esteve com Ele até o fim... Que, na verdade, era apenas o começo...
Pois é... nem Deus abriu mão de um carinho de Mãe...
Termina aqui minha meditação, mas vou me permitir tirar daí uma última e pequena contemplação. Há um momento, na relação que se estabeleceu entre Maria e seu Filho, que me parece fundamental, exemplar. Este momento talvez traduza a maior mensagem, o maior ensinamento que Maria Mãe nos deixou.
Aconteceu a partir de uma situação absolutamente banal e doméstica. Numa festa de casamento, em Caná da Galiléia. Fim de festa. O vinho acabara e os convidados, nada de ir embora. Os donos da casa estão envergonhados e constrangidos. Maria, aquela que percebe o que falta, apela para o seu Filho. A resposta, em princípio, parece ser uma negativa, até um pouco ríspida, daquele filho rebelde: “Mulher, ainda não é a minha hora...”
Maria volta-se para os criados que aguardam e diz:
“FAÇAM TUDO O QUE ELE DISSER! ”
Façam tudo o que Ele disser... Eis aí o modelo de vida deixado por Maria.
O que aconteceu depois, todos sabemos. Imagino Maria, chamando Jesus a um canto e dizendo-lhe, com firmeza mas sem perder a ternura jamais: “Eu sou sua Mãe, eu sei qual é a sua hora...”
E a festa estendeu-se até o dia amanhecer e todos beberam do vinho mais delicioso que já haviam provado...
Diante dos desafios que a vida propõe, nas encruzilhadas diante das quais nem sempre sabemos por onde ir, que caminho escolher, talvez seja este o recado que vem da Mãe de Deus, da Nossa Mãe...
FAÇAM TUDO O QUE ELE DISSER...
Mas, para isso, é preciso, primeiro, aprender a ouví-Lo...